Tribunal Judicial de Tomar

IPA.00016478
Portugal, Santarém, Tomar, União das freguesias de Tomar (São João Baptista) e Santa Maria dos Olivais
 
Arquitectura civil judicial: tribunal de 1ª instância do século 20, de "sabor renascentista" (ATIGFP-MJ: Memória Descritiva, ass. Januário Godinho, 1955). A composição modular das fachadas, a articulação volumétrica do edifício, com pátio ao centro e a organização simétrica da planta prolongam o padrão classicizante da arquitectura judicial, introduzido em Portugal em 1930 com a construção do Palácio da Justiça de Coimbra (PT020603170139) que segue o modelo francês oitocentista do "Templo Judicial". Este modelo teve origem no final do séc.17, na Bretanha, com o Palácio da Justiça de Rennes, que se constituiu um edifício paradigmático com uma influência determinante na estruturação formal e conceptual da arquitectura judicial ao longo de todo o séc. 19 e só renovado a partir da década de 60 do séc.20. Desenvolve-se numa planta de base quadrangular, aberta ao centro por um claustro, em torno do qual se dispõem simetricamente os vários serviços. Os eixos de simetria são fixados quer horizontalmente em planta, quer verticalmente nas fachadas principais e laterais, com o intuito de sugerir jogos de equilíbrio e rigor associados ao sistema judicial. O gosto pronunciado pela simetria verifica-se igualmente na gestão do espaço da sala de audiências. Estas disposições foram tratadas em numerosos textos teóricos, nos quais se procurava estruturar tipologicamente a ideia de "Templo Judicial", ligado ao culto da "divindade" (a Justiça) e, deste modo, associada à imagem dos templos da cultura helénica. Se a figura do quadrado e a multiplicação dos eixos de simetria asseguravam, simbolicamente, o sentido de igualdade e equilíbrio da Justiça, o recurso à gramática classicizante imprimia ao edifício os pressupostos de distância, monumentalidade, celebração e ritualização requeridos para o espaço judiciário durante o período do Estado Novo. Para além desta questão, específica do programa judicial, importa referir que a aplicação de uma gramática de expressão classicizante não constituiu um fenómeno isolado em Portugal. Durante as décadas de 30 e 40 ocorreu na Europa Central um movimento de reacção ao ideário do Movimento Moderno que, cruzado com uma crescente orientação político-ideológica de feição nacionalista, resultou na consolidação de um discurso arquitectónico de cariz celebrativo e monumental, que teve a sua máxima expressão na obra de Albert Speer, ou no Novo Realismo de Moscovo, por exemplo. Ilustrativo deste fenómeno generalizado foi o polémico concurso internacional, aberto em 1935, para a construção do Palácio das Nações, em Genebra, no qual o júri elegeu um projecto ancorado aos códigos historicistas da tradição académica em detrimento de propostas de orientação modernista, onde se incluía um projecto desenvolvido por Le Corbusier. Trata-se de um Tribunal Judicial de Comarca, sede de Círculo, integrado no Distrito Judicial de Coimbra. Originalmente projectado para albergar os serviços afectos ao Tribunal Judicial, às Conservatórias do Registo Predial e Civil e à Secretaria Notarial é hoje ocupado apenas pelo Tribunal Judicial, sendo composto por 3 juízos de competência genérica. A construção do Palácio da Justiça de Tomar enquadra-se no âmbito mais alargado da campanha de modernização do parque judiciário nacional empreendida pelo Ministério da Justiça durante o Estado Novo. Esta acção, encetada desde 1926 pelo então ministro da Justiça Manuel Rodrigues Júnior (1889-1946), assentou em dois desígnios fundamentais: a intenção de remodelação dos mecanismos processuais e da orgânica do sistema judicial, que teve como expressão a publicação do primeiro Estatuto Judiciário logo em 1927; e a criação de uma política de dignificação dos edifícios judiciais e consequente estabelecimento de uma rede nacional. Numa política de demarcação com o regime republicano e crescente afirmação de valores de carácter nacionalista, os edifícios dos tribunais - pela natureza das suas funções instrumentais, políticas e simbólicas -, passaram a comportar funções alegóricas, celebrativas e representativas que, na generalidade dos casos, se traduziram arquitectonicamente na aplicação de convenções estilísticas de acento monumentalista e gosto classicizante, como é o caso de Tomar. Apesar de delineado segundo o modelo classicizante, a solução proposta não perdeu contudo a definição racional e moderna da planta, hierárquica e funcionalmente estruturada a partir dos pressupostos normalizados pela Direcção-Geral da Justiça, em meados da década de 50, sob o ponto de vista estético, gramatical e funcional. A organização espacial e funcional dos edifícios deveria obedecer a um conjunto de critérios: respeitar os núcleos arquitectónicos regionais; ser hierarquicamente categorizado, mediante a sua composição formal e volumétrica; o mesmo se aplicando aos espaços internos de cada edifício, distinguidos pela escolha dos acabamentos e pelo programa decorativo; no piso térreo ficavam normalmente instalados os serviços dos registos civil e predial, destinando-se o piso superior aos serviços do Tribunal; quando dotados de cave, esta era destinada à sala de leilões e às celas, com acessos autónomos; no caso de existirem duas Salas de Audiências, a do tribunal colectivo deveria ter um tratamento mais cuidado do que a do tribunal singular; todos os gabinetes, celas, arrecadações, salas, etc. deveriam ser dotadas de entradas independentes; o custo médio da construção (tribunais de 1ª instância) não deveria ultrapassar os 1.300.000$00 / m²; a circulação dos magistrados, testemunhas, réus e público deveria fazer-se mediante dispositivos de portas e corredores autónomos. A disposição do mobiliário e organização da Sala de Audiências foi, igualmente, conformada às definições estabelecidas neste programa regulador. O edifício obedece a uma modulação constante que perpassa da estrutura para as fachadas e planta. As carpintarias e serralharias foram desenhadas, por Januário Godinho, exclusivamente para este tribunal, revelando grande preocupação no desenho do detalhe.
Número IPA Antigo: PT031418120054
 
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Registo

 
Edifício e estrutura  Edifício  Judicial  Tribunal  Tribunal de comarca  

Descrição

O edifíco distribui o programa funcional numa planta de base quadrangular vazada ao centro por um pátio interior, que alberga o corpo suspenso da sala de audiências. Propõe um diálogo entre o volume exterior, de configuração paralelepipédica e feição clássica, e o volume elíptico, assumidamente moderno, da Sala de Audiências que protagoniza conceptualmente a composição. Exteriormente o edifício é caracterizado por uma composição de linguagem clássica, ritmada pela abertura dos vãos e enfatizada pela modulação dos pilares estruturais que na fachada S. definem, ao nível do piso térreo, uma extensa galeria sobre a qual assenta o piso nobre e a partir da qual se acede ao interior do edifício. A fachada N. é "perfurada" por uma grelhagem que acusa exteriormente a localização da escadaria principal, que se desdobra em duas direcções até atingir o piso nobre e o espaço amplo dos "Paços Perdidos". No seu interior, o volume da Sala de Audiências centraliza toda a composição do tribunal, formalizando um corpo elíptico, revestido com uma expressiva "epiderme", cujos favos quadrangulares fechados com vidros coloridos e translúcidos filtram a iluminação coada do interior.

Acessos

Largo 5 de Outubro.

Protecção

Em estudo

Enquadramento

Urbano, destacado. Edifício localizado no limite do núcleo urbano, implantado no topo N. da Várzea Grande, em cujo terreiro se ergue o Padrão Filipino ou Padrão da Várzea Grande, (v. PT031418120097) e fronteiro ao Convento de São Francisco (v. PT031418120023). A E. destaca-se a Estação Ferroviária de Tomar (v. PT031418120072).

Descrição Complementar

Silhar e painéis cerâmicos policromados alusivos à "Lei" e à "Justiça", assentes sobre as paredes laterais do pátio interior, delineados por Jorge Barradas em 1959. Tríptico a fresco, assinado por Guilherme Camarinha, com 9m de comprimento e 3.85m de altura, intitulado "1619/1627. E a Justiça d'el-rei confirmou ao povo de Tomar a posse da sua Várzea Grande" e localizado no topo central da Sala de Audiências. Do mesmo autor e data, pintura a fresco - "Historia vero. Testis temporum. Lux veritatis. Magistra vitae. Nuntia vetustatis. Qua vocis. Alia nisi. Oratoris immortalitati commendatur "-, que percorre o friso do tecto, numa extensão de 32.65m,

Utilização Inicial

Judicial: tribunal de comarca

Utilização Actual

Judicial: tribunal de comarca

Propriedade

Pública: estatal

Afectação

Ministério da Justiça

Época Construção

Séc. 20

Arquitecto / Construtor / Autor

ARQUITECTURA: Januário Godinho de Almeida (1910-1990); CONSTRUÇÂO: António Lopes Simões

Cronologia

1927, 22 Jun. - publicação do primeiro Estatuto Judiciário, consagrado pelo Decreto nº 13.809. Para além da remodelação dos mecanismos processuais e da orgânica interna do sistema judicial, desenvolvida no âmbito da acção reformadora instaurada pelo ministro da Justiça Manuel Rodrigues Júnior desde 1926, este documento legislativo dedica um capítulo à "Instalação dos tribunais, suas sessões e audiências" (Cap. VI), a partir do qual se fixaram novos pressupostos com tradução directa na forma de articulação espacial das futuras estruturas judiciais, como sejam: a centralização física e administrativa dos serviços judiciais; a concepção funcionalista e hierarquizada do espaço; a introdução de novas entidades entretanto formadas como a Câmara dos Solicitadores, a Ordem dos Advogados e as Secretarias Judiciais; a organização da Sala de Audiências, recinto nuclear em torno do qual gravita todo o espaço judiciário. Ficava, igualmente, estabelecido que caberia às câmaras municipais a responsabilidade do financiamento e fornecimento de edifícios apropriados e de todo o mobiliário essencial ao funcionamento dos tribunais judiciais de 1ª instância [artº 164º], bem como o fornecimento, mediante o pagamento de renda, de residências devidamente mobiladas para instalação dos magistrados judiciais e delegados do Procurador da República. [artº 165º]. Estas residências obedeciam a critérios de normalização, entre os quais era sublinhado o despojamento e a ausência de ostentação sem, no entanto, deixar de oferecer as comodidades correspondentes ao estatuto dos magistrados; 1944, 23 Fev. - novo Estatuto Judiciário, pelo Decreto-lei nº 33.547 publicado durante o ministério de Adriano Vaz Serra, através do qual foram instaurados mecanismos de inspecção judicial de forma a permitir um maior controle quer ao nível do funcionamento administrativo e jurisdicional, quer no que concerne à conservação e manutenção das instalações dos tribunais. No ano seguinte era reforçado o regime de inspecções, através do Decreto-Lei nº 35.388, de 22 de Dezembro, criando-se um modelo de inquérito uniformizado, cujos resultados deram uma imagem geral das dificuldades manifestadas no parque judiciário nacional. Uma vez diagnosticadas as deficiências logísticas tornava-se evidente a incapacidade dos erários municipais na manutenção dos edifícios da justiça, o que implicou o empenhamento dos Ministérios da Justiça e das Obras Públicas na renovação do parque judiciário, para o qual foi estabelecido um plano de prioridades; 1955, Out. - Memória Descritiva que acompanha o projecto do edifício judicial, delineado pelo arq. Januário Godinho; 1959, 1 Mar. - inauguração do edifício do tribunal.

Dados Técnicos

Estrutura porticada em betão armado, com excepção do varedo do telhado;

Materiais

Revestimentos executados em PEDRA DOURADA de Tomar; estruturas, lajes, tectos e armações dos telhados em construídos em BETÃO; pavimentos em PARQUET de EUCALÍPTO, MADEIRAS do Ultramar e MÁRMORE; paredes do pátio de entrada, corredores e sala de audiências revestidas a AZULEJO policromado.

Bibliografia

SANTOS, A. Furtado dos, "A Administração da justiça", Celebrar o Passado. Construir o Futuro: ciclo de conferências promovido pela Comissão Executiva do 40º aniversário da Revolução Nacional, Lisboa: Edições Panorama, 1966; MARTINS, Soveral, A organização dos tribunais judiciais portugueses, Coimbra, Fora do Texto, 1990; Procuradoria-Geral da República, Relatórios dos serviços do Ministério Público [1992-1997], [Lisboa], [Procuradoria-Geral da República], 1992-1997; TOSTÔES, Ana Cristina, Os Verdes Anos na Arquitectura Portuguesa dos Anos 50, Porto, FAUP, 1997; PAIO, João Palma, Arquitectura Portuguesa de Justiça. Os Palácios de Justiça no Período do Estado Novo, dissertação de mestrado em Reabilitação da Arquitectura e Núcleos Urbanos, FA-UTL, 1996; Arquitectura do século XX: Portugal, coord. BECKER, Annette, TOSTÕES, Ana, WANG, Wilfried, Lisboa: Portugal-Frankfurt 97, Frankfurt am Main: Deutsches Architecktur-Museum, München - New York: Prestel-Verlag, [1998], 352 p.; NUNES, António Manuel, Espaços e Imagens da Justiça no Estado Novo. Templos da Justiça e Arte Judiciária, Coimbra, 2003; Arquitectura Moderna Portuguesa 1920 - 1970, coord. TOSTÕES, Ana, LACERDA, Manuel, SOROMENHO, Miguel, Lisboa, IPPAR, D.L., 2003; SANTOS, Dora M. dos, Museu Domus Ivstitiae - Casa da Justiça. Proposta de uma Rede de Museus para a Justiça, dissertação de mestrado em Museologia e Museografia, Lisboa, Universidade de Lisboa - Faculdade de Belas Artes, 2005 (texto policopiado); http://www.dgsj.pt; Arquitetura Moderna Portuguesa 1920-1970, IPPAR, 2004, p.232-233.

Documentação Gráfica

Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial do Ministério da Justiça - Arquivo Técnico

Documentação Fotográfica

IHRU: DGEMN/DSID

Documentação Administrativa

Intervenção Realizada

Observações

Autor e Data

Rute Figueiredo 2003, 2006

Actualização

 
 
 
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